quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

‘Privataria Tucana’: livro de Amaury mostra que Serra montou esquema comparável ao de Maluf, diz Nassif

Para jornalista, não há defesa para os denunciados no livro, que ‘decreta o fim político de Serra

Luis Nassif e Amaury Ribeiro Jr, autor de “A Privataria Tucana” (Geração Editorial)
http://amoralnato.blogspot.com/2011/12/e-guerra-merval-ataca-amaury-e-nassif.html

No artigo “'A Privataria Tucana' marca o fim de uma era”, publicado hoje no site de CartaCapital, Luis Nassif traz à luz as razões pelas quais provavelmente as denúncias bombásticas que contém o livro vão acabar em pizza. 

“O livro mostra a extensa rede de pessoas cercando Serra que, desde o início dos anos 90, fazia negócios entre si, utilizando o Banespa, o Banco do Brasil, circuitos de paraísos fiscais, as mesmas holdings utilizadas por outros personagens controvertidos para esquentar dinheiro”, diz Nassif.

Na ótica de Nassif, uma CPI baseada no conteúdo do livro dificilmente será criada “pela relevante razão de que o sistema de doleiros, paraísos fiscais, foi abundantemente utilizado por todos os partidos políticos, incluindo o PT”.

Nassif destaca que, dos personagens citados no livro, quem ficou pior na fita foi mesmo José Serra, não necessariamente perante a opinião pública, mas para seus próprios aliados políticos. “Afinal, montou um esquema que em nada ficou a dever a notórios personagens da República, como Paulo Maluf. Jogou pesado para enriquecimento pessoal e da família”, afirma Nassif.

Leia abaixo o artigo completo. 

‘A Privataria Tucana’ marca o fim de uma era 

Luis Nassif 

O livro “A Privataria Tucana” marca o desfecho de uma era, ao decretar o fim político de José Serra. A falta de respostas de Serra ao livro – limitou-se a taxá-lo de “lixo” – foi a comprovação final de que não havia como responder às denúncias ali levantadas.

O livro mostra como, após as privatizações, o Banco Opportunity – um dos maiores beneficiados – aportou recursos em paraísos fiscais, em empresas da filha Verônica Serra. Depois, como esse dinheiro entrou no país e serviu, entre outras coisas, para (simular) a compra da casa em que Serra vive. 

Tem muito mais. Mostra a extensa rede de pessoas cercando Serra que, desde o início dos anos 90, fazia negócios entre si, utilizando o Banespa, o Banco do Brasil, circuitos de paraísos fiscais, as mesmas holdings utilizadas por outros personagens controvertidos para esquentar dinheiro. 

Provavelmente o livro não suscitará uma CPI, pela relevante razão de que o sistema de doleiros, paraísos fiscais, foi abundantemente utilizado por todos os partidos políticos, incluindo o PT. Aliás, uma das grandes estratégias de José Dirceu, assim que Lula é eleito, foi mapear e cooptar os personagens estrangeiros da privatização que, antes, orbitavam em torno de Serra. 

Essa a razão de ter terminado em pizza a CPI do Banestado, que expunha personagens de todos os partidos.
Nesse imbróglio nacional, a posição mais sensível é a de Serra – e não propriamente para a opinião pública em geral, mas para seus próprios correligionários. Afinal, montou um esquema que em nada ficou a dever a notórios personagens da República, como Paulo Maluf. Jogou pesado para enriquecimento pessoal e da família.

Com as revelações do livro, quebra-se a grande defesa de Serra, algo que talvez a sociologia tenha estudado e que poderia ser chamada de “a blindagem dos salões”. É quando personagens controvertidos se valem ou do mecenato, das artes, ou da proximidade com intelectuais para se blindarem. O caso recente mais notável foi o de Edemar Cid Ferreira e seu Banco Santos. 

Serra dispunha dessa blindagem, por sua condição de economista reputado nos anos 80, de sua aproximação com o Instituto de Economia da Unicamp. Graças a isso, todos os pequenos sinais de desvio de conduta eram minimizados, tratados como futrica de adversários.

O livro provocou uma rachadura no cristal. De repente todas aquelas peças soltas da história de Serra foram sendo relidas, o quebra-cabeças remontado à luz das revelações do livro. 

Os sistemas de arapongagem, que permitiram a ele derrubar a candidatura de Roseana Sarney no episódio Lunus; o chamado “jornalismo de esgoto” que o apoiou, as campanhas difamatórias pela Internet, as suspeitas de dossiê contra Paulo Renato de Souza, Aécio Neves, o discurso duplo na privatização (em particular apresentando-se como crítico, internamente operando os esquemas mais polêmicos), tudo ganhou sentido à luz da lógica desvendada pelo livro.

Fica claro, também, porque o PSDB – que ambicionava os 20 anos de poder – jogou as eleições no colo de Lula. 

Todas as oportunidades de legitimação da atuação partidária foram preteridas, em benefício dos interesses pessoais da chamada ala intelectual do partido. 

A perda do bonde do real 
No início do real, os economistas enriqueceram com operações cambiais, em cima de uma apreciação do real que matou a grande oportunidade de criação de um mercado de consumo interno. A privatização poderia ter sido conduzida dentro de um modelo de fundos sociais, que permitiria legitimá-la e criar um mercado de capitais popular no país. Mas os interesses pessoais se interpuseram no caminho do projeto político do partido. 

O cavalo encilhado
O fim da inflação permitiu o desabrochar de um mercado de consumo de massa, dez anos antes que o salário mínimo, Bolsa Família e Pronaf abrissem espaço para a nova classe média. Estariam assegurados os 20 anos de poder preconizados por Sérgio Motta, não fosse o jogo cambial, uma manobra de apreciação do real que enriqueceu os economistas mas estagnou a economia por uma década. FHC jogou fora a chance do partido e do país. Conto em detalhes essa história no livro “Os Cabeças de Planilha”. 

A falta de Mário Covas
Fica claro, também, a falta que Mário Covas fez ao PSDB. Com todas as críticas que possam ser feitas a ele, a Lula e a outros grandes políticos, havia neles o sentimento de povo. Na campanha de 2006, ouvi de Geraldo Alckmin a crítica – velada – à ala supostamente intelectual do PSDB. “Covas sempre me dizia para, nos finais de semana, andar pelas ruas, visitar bairros, cidades, para não perder o sentido do povo”. 

Os construtores e os arrivistas
Não se vá julgar impolutos Covas, Lula, Tancredo, Ulisses, o grande Montoro, Grama e outros fundadores do Brasil moderno. Dentro do modelo político brasileiro, montaram acordos nem sempre transparentes, participaram dos pactos que permitiam o financiamento partidário, familiares se aproveitaram das relações políticas para pavimentar a vida profissional. Mesmo assim, imperfeitos que eram – como políticos e seres humanos – havia neles a centelha da transformação, a vontade de deixar um legado, o apelo da redemocratização. 

A ala intelectual do PSDB
Esses atributos passavam ao largo das ambições da ala intelectual do partido, os economistas financistas de um lado, o grupo de Serra do outro. O individualismo exacerbado, a ambição pessoal, a falta de compromisso com o próprio partido e, menos ainda, com o país, fizeram com que não abrissem espaço para a renovação. Com exceção de Serra, FHC não legou para o partido um ministro sequer com fôlego político. Como governador, Serra não permitiu o lançamento político de um secretário sequer. 

A renovação tímida 
A renovação do PSDB se deu pelas mãos de Alckmin – ele próprio não revelando um secretário sequer com fôlego para sucedê-lo – e, fora de São Paulo, de Aécio Neves. Ao desvendar as manobras de Serra, o livro fecha um ciclo de ódio, personalismo, de enriquecimento de pessoas em detrimento do país e do próprio partido. No começo, será um baque para o PSDB. Passado o impacto inicial, será a libertação para o penoso reinício político.

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